5 de novembro de 2015

Por que partiu tão cedo?

Faço parte de um grupo de perda gestacional, e estar em contato com tantas mulheres, tantas histórias, tantas dores, fortalece.

Fortalece porque vejo nelas amor e beleza. Os mesmos sentimentos que envolvem a nossa história com a Helena.

Eu me sinto acolhida, e lá não tenho pudor em desnudar minha alma e meu coração feridos.

Uma das fundadoras do grupo é a Bel Cristina. Tão sensível em suas palavras que logo quis saber se ela havia passado pela mesma experiência que eu.

Então, ela me direcionou para a mensagem abaixo onde tudo explica e esclarece... E onde me fez entrar em contato com palavras tão lindas e profundas provenientes da pergunta "Por que partiu tão cedo?". A pergunta que me faço todos os dias, a pergunta que deu origem ao grupo do Facebook que hoje me oferece apoio emocional:
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Postado por Bel Cristina no Grupo do Facebook "Por que partiu tão cedo?"

- Após a matéria refleti sobre e achei por bem postar aqui o que desencadeou a necessidade de falar sobre o assunto, tão sufocado, com um 'silêncio imposto'. Onde vejo que as pessoas não conseguem lidar com suas próprias emoções, daí a dificuldade de lidar com a do semelhante.

Adiciono aqui a carta que deu origem a esse grupo, após ter acompanhado o parto de uma pessoa/família, muito querida anteriormente, que já sabiam que seu bebê era especial ainda na gestação. Que poderia partir a qualquer momento. Ainda assim o casal decidiu levar adiante a gestação. E, esse bebê, nasceu, ficando entre nós por volta de 40 minutos e foi partindo. De forma 'suave', junto a todos ali presente. Em silêncio, todos abraçando essa nova vida que chegou e partiu tão 'precocemente'. Após esse acompanhamento veio outro, tempos depois. Onde o casal nos convidou a orar junto com eles. E, fizemos uma prece. Todo ambiente aqueceu-se. Ainda que fosse triste, teve a beleza, a nobreza de assistir esse casal junto a seu bebê. A prece, independente da religião, pode nos proporcionar esse conforto, apoio. E, após essa partida, surgiu o grupo. Quesia, Rosa e vossas famílias, meu terno e grato abraço.

Onde, através da Rafaella Biasi Gimenes, tive o prazer de encontrar Renata Duailibi e Ana Lana e, juntas nos identificamos, percebendo a necessidade de nos unir em prol de ampliar a Rede de apoio - Abraço Solidário. Sem esquecer do Renato Janone, pessoa incomum as nós 03 e, grande incentivador desse acolhimento.

Então, o grupo passou a não ser mais somente um sonho meu, mas de todas as famílias que comungam do mesmo sentimento. E, com muito respeito, compartilho com vocês, pois no início, até comentei. Depois muitas adentraram e não sabem como o grupo aconteceu.

- OBS - Participei de uma palestra e ouvi de uma pajé - que seu povo não fala 'morte', não acreditam nela. Mas, sim, fazem uma 'viagem'. Onde aprendem a respeitar a memória de seus entes queridos. Sabedoria de um povo massacrado, sufocado e, que lutam para manterem-se. Poder aprender com eles resgatar o respeito a vida, mesmo diante da 'viagem'. Que possamos resgatar nova riqueza de valores e fazer de toda nossa experiência de vida, uma possibilidade de transformação.

Esse bebê partiu 08/05/2013, com 32s5d. E, escrevi após chegar em casa:

Por que partiu tão cedo?
Por que os bebês se vão mesmo antes de chegar?
Acompanhar esse desfecho sem se envolver é algo, extremamente, delicado.
Ter tal oportunidade de ter nos braços esse 'anjinho', que não esta mais entre nós, fisicamente, falando, mas que em Essência vibra somente o desejo de tê-lo de volta.
Ver o quanto pode ser doloroso, mas 'encantador', por tamanho amor.
Agora, somente, agora me cai essa ficha... tive você em meus braços, seu corpinho já inerte, mas que emanava tanto amor.
Emanava calor, ainda que frio.
Como posso sentir isso?
Como posso senti-lo com tanta intensidade?
Se 'existe' Deus, Ele está nessa hora.
Ele representa esse momento,tão doloroso e, ao mesmo tempo, tão sublime.
A dor quis dilacerar-me, mas olhei para seu rostinho, tão pequenino, tão delicado, teu corpinho e, não pude, não pude deixar de encantar-me por você.
De vê-lo, de senti-lo, de segurá-lo, fortemente, em meus braços.
Acho que ainda não consigo ser imparcial, que ainda preciso aprender muito com tantas outras mulheres-casais para ser além da 'dor'.
Deus, como é forte, como é intenso.
Só agora me permiti sentir, chorar, chorar...
Chorar um choro de dor, de encantamento, de desilusão, enfim... as lágrimas rolam soltas, livres, sem pudor, sem revolta.
Estava anestesiada ou fora de mim?
Afaguei tua fronte, senti teu cheirinho - tão marcante, tão seu - tão meu, e, após longo tempo tive que deixá-lo, tive que soltar-me de ti.
Como aprendo com tantas famílias.
Meu respeito, admiração, reverência a todas as mulheres-casais que passaram, que estão passando e que, infelizmente, passarão por tal vivência a 'perda' de seu bebê, tão desejado, amado. 
Não, não me digam que não devo chorar, pois ainda poderei ter outros.
Não, não me digam que dos males o melhor, que eu me salvei...
Não, não me digam...
Deixem-me chorar essa dor, esse luto, pois em Essência, independente do tempo, esse bebê esteve comigo, esteve em meus sonhos, visitou-me no meu dia a dia.
Então, não me diga para não chorar, para não viver esse luto. Pois, é esse mesmo luto que me fará, não sei em que tempo-momento, superar, 'virar a página'.
Esse bebê vive, vive em Essência, no ar que respiro, no nascer do sol, no por do sol.
Curvo-me em silêncio e respeito a esse casal que honrou-me com esse abraço caloroso, num nascimento digno, respeitoso ao filho amado que partiu antes mesmo de estar conosco. 
Bebê fique em paz, nos braços de Deus, assim como tua família.
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Merece ser dito que a carta que Bel Cristina escreveu, expressa tudo o que sinto no coração nesse momento.


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