20 de agosto de 2016

Encerrando um ciclo

O aniversário da Helena passou, e as datas foram mais leves do que eu imaginava...

Fiquei pensando em como seria esse post, se seria o último ou se ainda escreveria sobre a minha experiência que, embora difícil, guarda tanta beleza.

Hoje tivemos o encontro mensal do Grupo Acolher & Viver, e relembrei grande parte do meu processo com a exibição do documentário "O Segundo Sol". Aproveito essa energia para encerrar um ciclo.

Fiquei aliviada por ter chegado até aqui de forma íntegra.

Posso dizer que cheguei ao fundo do poço, e várias vezes pensei que jamais conseguiria sair.

Quando publiquei o blog, minha intenção era dar vazão a todos os sentimentos da forma mais realista possível... Talvez ajudar outras mães que passaram pelo mesmo que eu.

Mas não queria romantizar minha perda... Não queria enfeitá-la com laços apenas para atender as expectativas alheias.

Sim, minha filha é única e especial e eu não abriria mão da experiência de tê-la comigo por nove meses. 

No entanto, acredito firmemente que as pessoas têm pouca habilidade para lidar com a dor do outro.

E essa inabilidade muitas vezes nos leva a comportamentos e atitudes que dificultam a nossa elaboração do luto. Reconheço que dores desse tipo sempre vêm bater à nossa porta, de uma forma ou de outra. No meu caso, decidi que deveria ser o quanto antes.

Pensava que se eu não pudesse chorar a morte da minha filha, o que o mundo me permitiria chorar se não conheci dor tão profunda quanto essa? (e já perdi pessoas muito, muito, amadas)

Refletia, ainda, que meu momento de sentir dor era de fato os primeiros dias, semanas e meses da morte da Helena... O momento de chorar era aquele... Não queria postergar as minhas lágrimas, pois achava que o futuro não era o lugar mais adequado para me encontrar com esse vazio.

Senti muita dor no corpo e na alma... Enfrentei meus piores fantasmas. Por várias vezes esses momentos não couberam aqui de tanta crueza.

Sim... Os momentos mais difíceis não puderam ser escritos, mas sempre que uma mãe se encontrar comigo nessas fases, terá meu colo e mais sincero abraço. Provavelmente choraremos juntas.

Hoje eu me percebo mais conectada com o amor que sinto pela Helena e pelo que vivemos juntas. A dor da sua morte está mais distante e eu consegui integrar sua ausência à história da minha vida. Não consigo expressar exatamente em palavras, mas é algo próximo da aceitação.

Ressalva: é algo próximo da aceitação, mas não é aceitação. Afinal, que mãe não preferiria ter seu bebê nos braços? 

Não é possível atravessar esse deserto sozinha. Não imagino como seria sem a minha terapeuta, médica, grupos de apoio, marido, filho, familiares, amigas. Devo minha mais sincera gratidão a todos aqueles que me apoiaram nesse processo e respeitaram o meu tempo.

Se tem uma mãe se perguntando se o luto acaba em um ano, respondo que não sei.

Mas o que diferencia é que estou aprendendo a encontrar a Helena no que chamo de País do Amor, um lugar fora do nosso espaço-tempo. Onde não existem vivos ou mortos, apenas pessoas que se amam.

A gente se encontra em sonhos (embora raros), na imaginação e nas cartas que escrevo especialmente para ela.

No seu aniversário, escrevi todos os dias (do dia 10 ao 13). Comprei flores, acendi uma vela e me esforcei ao máximo para preencher nossa casa de amor. 

No dia 10 fizemos um ritual muito bonito no consultório da minha terapeuta. Houve a participação do meu filho e marido e eles puderam expressar seus sentimentos, o que foi muito bom para eles e para mim.

Assim termina parte dessa jornada e, acredito, finalizam meus posts aqui. 

Deixarei o blog aberto para visitas. Divulguem, comentem, pois permanecerei em contato com pessoas que estejam passando pelo mesmo que eu passei.

Quero me dedicar agora à divulgação do Grupo Acolher & Viver, ampliando essa rede de apoio. Também vou seguir com outras transformações que desejo fazer em minha vida.

Acima de tudo, Helena permanecerá viva em meu coração. Sempre, sempre... Até o dia em que eu fechar meus olhos para esse mundo e acordar no outro, onde acredito que ela estará me esperando.

Linda e luminosa como sempre foi.

Te amo, minha bebê... Minha gorduchinha... Minha passarinha...


Nossa foto depois que nasceu, foi banhada e vestida. Faltou o Henrique.


A lembrancinha que decidimos distribuir mesmo após a perda. A entrega possibilitou momentos lindos com pessoas que amamos. Foi muito importante essa decisão para nós.


A flor da Helena em seu aniversário, e os sapatinhos que a representaram no nosso ensaio fotográfico de 5 meses de gravidez.


O cantinho da Helena em seu aniversário.
 Momento de oração, amor e conexão com nossa passarinha.

4 de agosto de 2016

Passarim

Li um texto muito bonito hoje...


Ao final, deparei-me com uma jóia. Uma música linda, linda... 

Eu não conhecia essa canção, mas acabou sendo um belo presente há poucos dias do aniversário da passarinha. É uma música da saudade de quem tanto amamos... a música do primeiro aniversário da nossa pequenina Helena.

Passarinha, receba todo o nosso amor. Sempre!


Passarim
Tom Jobim

Passarim quis pousar, não deu, voou 
Porque o tiro partiu mas não pegou 
Passarinho me conta então me diz 
Porque que eu também não fui feliz 
Me diz o que eu faço da paixão 
Que me devora o coração 
Que me devora o coração 
Que me maltrata o coração 
Que me maltrata o coração 

E o mato que é bom, o fogo queimou 
Cadê o fogo, a água apagou 
E cadê a água, o boi bebeu 
Cadê o amor, o gato comeu 
E a cinza espalhou 
E a chuva carregou 
Cadê meu amor que o vento levou 
(Passarim quis pousar, não deu, voou) 

Passarim quis pousar, não deu, voou 
Porque o tiro feriu mas não matou 
Passarinho me conta então me diz 
Por que que eu também não fui feliz 
Cadê meu amor minha canção 
Que me alegrava o coração 
Que me alegrava o coração 
Que iluminava o coração 
Que iluminava a escuridão 

Cadê meu caminho a água levou 
Cadê meu rastro, a chuva apagou 
E a minha casa, o rio carregou 
E o meu amor me abandonou 
Voou, voou, voou 
Voou, voou, voou 
E passou o tempo e o vento levou 

Passarim quis pousar, não deu, voou 
Porque o tiro feriu mas não matou 
Passarinho me conta então, me diz 
Por que que eu também não fui feliz 
Cadê meu amor minha canção 
Que me alegrava o coração 
Que me alegrava o coração 
Que iluminava o coração 
Que iluminava a escuridão 
E a luz da manhã, o dia queimou 
Cadê o dia, envelheceu 
E a tarde caiu e o sol morreu 
E de repente escureceu 
E a lua então brilhou 
Depois sumiu no breu 
E ficou tão frio que amanheceu 
(Passarim quis pousar, não deu, voou) 
Passarim quis pousar não deu 
Voou, voou, voou, voou, voou

3 de agosto de 2016

Luto do irmão

De fato, não tive muita inspiração para escrever por aqui.

Parece que nada era tão digno de anotação... Mas o processo de renovação após a morte da Helena e reconstrução das nossas vidas continuou.

Em Julho eu fui ao Santuário da Nossa Senhora Desatadora dos Nós e foi muito significativo. Coloquei a Helena nos braços da Mãe... Coloquei lá também o meu coração para que seu amor e compaixão o curasse. Pedi por meu marido e também pelo meu filho.

Pedi especialmente pela Helena, claro.

Eu me emocionei muito e acredito que tenha sido um ritual importante para o encerramento desse ciclo. O ciclo do aniversário da nossa filha.

No mês passado, publiquei meu primeiro artigo no site "Do Luto à Luta - Apoio à Perda Gestacional e Neonatal" sobre o nome do bebê na Certidão de Natimorto. Tive retorno de algumas mães e percebi que foi um trabalho muito importante. Quero realmente contribuir para que nenhuma família se sinta sozinha nessa dor. Quem sabe ainda poderemos mudar algumas questões regulamentares e legislativas a esse respeito, também?

O importante é que hoje temos espaço para falar sobre um assunto tão delicado.

Mas o que me motivou realmente a escrever aqui hoje foi o meu filho...

Ontem, voltando pra casa, ele me perguntou se a Helena tinha nascido no ano passado. Respondi que sim, e que em breve faria um ano. Que essa data sempre seria muito especial para nós.

Mas ele ficou muito triste.

Quando fizemos o Evangelho à noite, e na oração final pedi especialmente pela Helena, ele chorou.

As lágrimas foram sinceras e sentidas.

E me perguntou: Por quê com a Helena, mamãe?. Não que eu quisesse que fosse com outra pessoa, eu não queria que isso acontecesse com ninguém, nunca...

Fiquei tão surpresa com sua pergunta e reflexão madura. Porque por diversas vezes me questionei da mesma forma.

Faz tempo que eu já não pergunto mais, pois não importa a razão. Importa o que fazemos dessa experiência em nossas vidas.

Há aproximadamente três semanas tive sonhos muito significativos que têm me ajudado a elaborar e organizar meus sentimentos. Finalmente sinto que o lado doloroso do que passamos está partindo. E, embora sempre tenha achado que perdi minha filha, comecei a perceber o quanto ela está presente em mim.

Que a dor vá embora, e fique definitivamente o amor.

O meu filho é um menino de apenas 8 anos... Sabemos que seu processo de elaboração será à medida que for aumentando a sua compreensão de tudo.

Se eu pudesse, tiraria essa dor dele. Mas acredito que o conhecimento da morte de forma tão precoce o tornará um homem forte. Três vidas importantes para ele se foram: tio, avó e irmã. Pouco tempo de intervalo entre elas... 

Mas a "perda" da irmã realmente feriu seu coração de menino.

Se alguém quiser compartilhar a experiência do irmão ou irmã com relação a perda do bebê, sinta-se à vontade nos comentários.

Força, amor e luz para todos nós!